"E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam escutar a música." Nietzsche

Formspring

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Crônicas Ribeirenses

AS ASAS, O ASSOMBRO E O ESQUECIMENTO

Era mais um vagaroso dia, bem ao ritmo dos interiores minúsculos destes sertões. Ao longe um barulho começava a chamar atenção dos ouvidos ávidos por novidades. Era um flap flap longínquo, podendo até ser o farfalhar de bananeiras, mas não havia nem próximas e nem em quantidade suficientes para o agora frenético e crescente barulho, vindo em nossa direção.

Eu, meu irmão e meu primo nos entreolhamos espantados e cientes do extraordinário, dando um pulo para fora de casa, buscando lá nos ares até encontrar a razão do nosso espanto: Um incrível helicóptero cortava os céus de Ribeira! Agora, porém, já não éramos apenas três, porque de todas as casas e de todas as ruas, bem como de todas as idades e sexos, víamos correr pessoas tentando acompanhar o surreal objeto. Olhando para o alto, para não perdê-lo de vista, e olhando para os lados, para não esbarrarmos uns nos outros, devemos ter causado nos pilotos o mesmo espanto que eles estavam nos causando.

Era gente por todo lado, quebrando o cenário invariavelmente vazio dos dias comuns, da cidade simples e invisível. Mas aquele não era um dia comum, porque além de voar por sobre as nossas cabeças um enorme helicóptero, a geringonça alada decidiu pousar, escolhendo o campo da cidade para descer de maneira verdadeiramente apoteótica! Quando ele finalizou a decida, você olhava ao redor do campo e tinha muito mais pessoas do que no mais importante de todos os jogos, em todos os tempos. 

O campo era localizado no atual centro de abastecimento, e enquanto aguardávamos o desenrolar da história, silentes e respeitosos com o desconhecido, atrás das quatro linhas, Dona Zelina rezadeira, figura alta, magra, vestida com roupas de chita colorida e lenço no cabelo, com a sua coragem etílica, se dirigiu até a aeronave, com as hélices ainda em movimento, fazendo descer preocupado um dos pilotos, para levá-la de volta.

Depois disso ele entrou novamente na cabine e voaram sem maiores explicações! Até hoje não sabemos o que eles vieram fazer por aqui, mas decerto a visita nos deixou com assunto para falar por muito tempo, ajudando a preencher os espaços entre os ponteiros dos relógios, sempre tão lentos! Na minha cabeça de menina, porém, durante toda a aventura tive esperanças de que aquela aeronave tinha vindo nos livrar do esquecimento, talvez como muitos que ali estavam. Mas seria extraordinário demais que isso fosse verdade.

Nenhum comentário: